soubessem eles

by catarina clemente

soubessem eles

da ternura dos teus gestos,

do riso dos teus olhos,

da doçura da tua voz.

 

soubessem eles

dos beijos que me poisas no pescoço

e do abraços espontâneos, protectores e apertados.

 

pudessem eles ouvir

os nomes que me sussuras

e o amor que me sopras ao ouvido.

 

tivessem eles visto

os nossos lugares secretos

ou a cápsula,

transparente e invisível,

que só um velho

de coração partido pôde discernir.

 

soubessem eles

que me fazes reparar no cheiro da relva acabada de cortar

e voltas atrás para me apanhar uma flor.

que pões a mesa como eu gosto,

que acendes uma vela e me serves vinho.

que me chamas à janela para ver a beleza de um céu cinzento e carregado

e, à tua maneira, lembras-me quem foi que o desenhou.

 

pudesse eu explicar-lhes

as conversas sérias,

os diálogos senis,

as gargalhadas,

os silêncios,

os olhares.

e que, ao teu lado, começo a conhecer-me

e – aos poucos – a entender o mundo.

 

soubessem eles que escolhes ser feliz com o possível,

que desprezas o pessimismo e a vitimização

e preferes as memórias boas.

e que, por tudo isso, me fazes bem.

 

soubessem eles

e – por fim –

seriam capazes de entender.

 

(mas como poderiam saber,

se estão demasiado ocupados a julgar?)